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A ciência por trás da mentira: por que caímos em golpes? BBC Brasil


Golpistas combinam sempre os mesmos sete princípios para enganar vítimas



Até o começo deste ano, o laureado professor britânico Paul Frampton - educado em Oxford - lecionava física na Universidade da Carolina do Norte.

Em 2012, o professor foi condenado a cinco anos de prisão por tráfico de drogas. Ele foi vítima de um esquema de golpistas envolvendo um site de relacionamentos. O caso acabou com sua carreira de professor na universidade.

O psicoterapeuta John Worley também não escapou de uma famosa rede de golpistas nigerianos. Ele foi contatado por e-mail por pessoas que se diziam funcionários do governo da Nigéria. No e-mail, os golpistas pediam ajuda para transferir uma grande fortuna para fora do país.

Tudo que Worley precisava fazer era transmitir uma pequena quantia aos funcionários, para que eles liberassem a fortuna. Worley acabou condenado a dois anos de prisão.

Inteligência não protege

Inteligência e experiência não protegem ninguém contra golpes, segundo David Modic, acadêmico da Universidade de Cambridge que estuda a psicologia por trás dos golpes de internet.

Então o que faz alguém ficar vulnerável? O ponto de partida de Modic foi uma pesquisa com mil pessoas - algumas delas vítimas de golpes. Ele conduziu um teste de personalidade com as vítimas, e identificou várias características em comum.

Algumas dessas características parecem óbvias para qualquer vítima de golpe, como a falta de autocontrole. Mas alguns traços de personalidade geralmente vistos como virtudes - como confiança na autoridade ou desejo de ser amigável - também são mais presentes entre as vítimas de golpes.

Psicólogos podem estar percebendo esses traços só agora, mas os golpistas já sabem disso há muito tempo. Uma forma de convencer as vítimas é fingir que ambos possuem algum conhecido em comum. Quando isso não funciona, outro disfarce eficaz é o de autoridade - alguém como um médico ou advogado.

O pesquisador em assuntos de segurança e privacidade da Universidade de Cambridge, Frank Stajano, também estudou os truques na manga de golpistas. Em seu trabalho, ele contou com a colaboração de Paul Wilson, um mágico que presta consultoria a cassinos.

Wilson também é roteirista do programa de televisão da BBC The Real Hustle ("O verdadeiro golpe", em tradução livre), no qual ele coordena uma equipe que aplica golpes diversos em pessoas comuns. O objetivo do programa é conscientizar as pessoas sobre os perigos dos golpes, e todo dinheiro "ganho" é devolvido imediatamente.

Sete princípios

Stajano logo percebeu que o programa sempre usa os mesmos sete mecanismos de convencimento. Três destes também coincidem com os identificados por Modic.

O primeiro é o "princípio do tempo" - os golpistas sempre convencem suas vítimas a agir rápido, "antes que seja tarde demais". Assim eles conseguem colocar pressão, sem ter tempo para raciocinar com lógica ou exercer qualquer tipo de auto-controle.

Outros dois princípios são o de obediência à autoridade e a "mentalidade de manada". Ambos servem para convencer a pessoa de que seus atos são legítimos. As pessoas têm tendência de sempre se comportar como aqueles a seu redor.

Mas Stajano diz que ainda há outros quatro princípios.

Um deles é o da distração - fazendo com que as pessoas não percebam que estão sendo vítimas de um golpe. Um exemplo é roubar um carro em uma garagem usando um uniforme falso de manobrista. Muito comum nesse caso é o uso de algum tipo de golpista assistente muito atraente sexualmente, como forma de distrair a vítima.

O quinto princípio listado pelos especialistas é o do desejo - golpitas percebem o que as pessoas querem ter e jogam com isso a seu favor. Esse é o segredo de muitos sites de relacionamentos que na verdade são golpes. Em busca de um relacionamento, as pessoas são atraídas por fotos de belas mulheres ou homens.

O sexto princípio é o da desonestidade. Muitas pessoas estão dispostas a infringir um pouco as regras para ter algum benefício. É isso que está por trás do golpe do e-mail nigeriano, no qual a vítima vira cúmplice dos criminosos. Isso dificulta posteriormente a busca por ajuda por parte da vítima, já que ela também cometeu um delito e pode ser punida.

O último dos princípios é o da caridade - pessoas que usam simpatia com o sofrimento dos demais para extorquir dinheiro. Isso pode ser feito por pessoas que se fazem passar por instituições de caridade.

Truque velho

Stajano diz que o fascinante do mundo dos golpes é que a maioria deles existe há séculos - e as pessoas continuam caindo neles.

O golpe do e-mail nigeriano parece ser um produto da era digital, mas, segundo o pesquisador, ele existe desde o século 16. Na época, havia o golpe do "prisioneiro espanhol", em que uma pessoa mandava uma carta a outra pedindo uma contribuição para ajudar a soltar um suposto aristocrata espanhol preso. Quando liberado, o aristocrata recompensaria a vítima com uma vasta fortuna.

O professor de Cambridge afirma que muitos sistemas criados por especialistas em segurança ignoram a "psicologia dos golpes" - e por isso fracassam.

"Muitos profissionais do ramo de segurança pensam: as pessoas são o problema - meu sistema é perfeito e super-seguro, desde que as pessoas aprendam a se comportar", diz Stajano. Para ele, os sistemas de segurança e proteção precisam prever e antecipar o comportamento real das pessoas.

Muitos desses princípios são inevitáveis por serem parte da natureza humana. A obediência à autoridade é uma virtude necessária para se conviver em sociedade. Também o "comportamento de manada" é importante em qualquer relação comercial - todos confiamos em lojas online porque vimos outras pessoas comprarem e receberem seus bens com segurança.



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